Quando
menino ainda, lembro-me bem, de minha
velha infância, quando meus pais abriram filiais, da nossa loja de tecidos e móveis, nas cidades de
Guaimbê e Júlio
Mesquita, com denominação de: “Casa
da Baixa”(e até hoje, o ouço
cantar, enquanto varria a calçada) :
“A Casa da Baixa chegou em Guaimbê (bis)
E
quem quiser fazer compras, que corra e venha vê...
Tudo
bonito, tudo barato..., só não compra só quem não qué...(bis)
(Quem
não pudé vir à cavalo, que venha à pé...)”
&&&&&&&&&&&&&&&&
Íamos
no ônibus ou jardineira que fazia linha Getulina-Garça, e vice versa, pela
estrada velha de terra, que passava pelo Mato do Galêgo, pois, naquele tempo, não possuíamos a nova via asfaltada, portanto não haviam as
arapucas das crateras que têm vitimado muita gente, e danificado inúmeros veículos...(Às
vezes, sentimos vontade de encabeçar campanha, a fim de que se retire a camada
asfáltica, e deixe o solo primitivo de terra... que, voltemos, como antes, a enfrentar, muitas vezes, o areião, as
poeiras... e, quando chover, o barro ou lamaçal , porém , sem o perigo
atual...) saíamos de Getulina às 7,00
horas e chegávamos em Guaimbê, minha mãe e eu, quase 8,00 horas da manhã, meu
pai seguia adiante, na mesma jardineira, indo até Júlio Mesquita., retornávamos
às 18,30 horas, chegando em Getulina depois das 19,30 horas, se tudo corresse
bem...
O
motorista da jardineira (da Empresa Irmãos Vizotto), era o Kelé Bigóde, um homem verdadeiramente pândego, de
estatura média, moreno, alegre e
brincalhão.
Na
ida passávamos pelo já dito Mato do Galêgo, depois, em frente às Fazendas : Boa Esperança,
Aroeira, Alianças (Primeira e Terceira) , Pau D’Alho, e, caminhos para o Panay
e Jurema, muitas outras propriedades,
todas apinhadas de gente e pés de café, tanto de um lado, como do
outro, de muitas delas, avistávamos as
enormes colônias, que abrigavam o
pessoal, trabalhadores rurais, que ajudavam a formar e cultivar os imensos cafezais, do maior centro
cafeeiro do mundo .
Por
essa e muitas outras estradas do nosso município, transitavam as intermináveis
boiadas e tropas , com milhares de animais, que eram conduzidas pelos
boiadeiros e pelos
tropeiros.
O
motorista Kelé, quando passava por pedestres ou caminhantes, que iam e viam pela estrada, costumava passar trotes, dizendo : -“Cuidado que ai atrás vem vindo
uma boiada com gado muito bravo, cuidado !” O pessoal saia correndo, adentrando
ao cafezal em debandada carreira...
Era
só risadas... e quando, depois, encontrávamos
o motorista, aqui na cidade, gritávamos : Kelé ! Ele
respondia, com sua voz grossa,
sorrindo : Méééé...!
E nos dias de carnaval e
Folia de Santo Reis, o Kelé costumava
fantasiar-se de Boi-Bumbá...
O
Kelé Bigode, morava em uma casa de
madeira, que ficava nos fundos do grande terreno, onde depois , passou, como
propriedade , pelos nomes dos saudosos amigos : Alberto/Luiz Carlos Nardi , que
iniciaram a construção de uma bela
residência; Nilo Falqueiro, que a
terminou, posteriormente, vendendo-a para o Ditinho Valenciano.
De
vez em quando , ia na filial da Casa da Baixa,
de Júlio Mesquita, e passava
pela Fazenda Chantembled (uma das
maiores propriedades rurais do Estado, com mais de sete mil alqueires de
terras) , ocasião que meu pai nos
contou, ouvira dizer, que o dono dela vendera um pequeno pedaço para Max
Whirts, apenas, l.500 alqueires, que transformou-se na famosa Fazenda Suíça.
Em
ambas Fazendas, haviam inúmeras casas para os colonos, além da casa da sede,
que era sempre a maior e mais bonita, possuía também : armazém, cinema, bares,
lojas, oficinas, igrejas, escolas, campos
de futebol, bochas, malhas, parques infantis e clubes de festas e danças.
Foram conhecidos e aplaudidos os times de futebol
das Fazendas : Chantembled e
Suíça, que participaram de vários torneios, em Garça, Julio Mesquita, Guaimbê, e
Getulina.
Para
cercar os milhares de alqueires da Fazenda Chantembled, o seu proprietário
adquiriu , em um leilão na Alemanha, os arames que cercavam, os famosos
Campos de Concentração alemães, na época da guerra, e os trouxe de navio
para o Brasil, depois, do Porto de
Santos, foram transportados de
trem e caminhões , para a dita e imensa propriedade rural.
Desse
modo, apenas para ilustrar, vejam só onde vieram parar os arames dos locais
de tantas torturas e
sofrimentos...(!!??).
Não
sei se foi em razão disso, ou de outros acontecimentos, mas, dizem que, na Fazenda Chantembled, nas noites de sexta
feira, aconteciam coisas estranhas que amedrontavam seus moradores, seus animais e pessoas visitantes.
Apesar
das rezas e bençãos, que se faziam pela
propriedade, nada adiantava, os fatos voltavam a acontecer em cada sexta feira,
de forma, cada vez mais, assustadora.
Uma pessoa estranha,
montada em uma enorme porca, aparecia , por volta da meia noite, de cada sexta feira, causando muito medo e
arrepios na população rural daquelas bandas, e depois desaparecia,
inesperadamente....
Motivo
pelo qual, a importante propriedade rural, ficou conhecida como a “Fazenda da
Porca”.
Contratou-se
pessoas valentes e religiosas para dar fim ao problema.
Dentre
elas, um homem forte, falante e dizendo ser muito valente e corajoso, um tal de
Caculé, prometia para a próxima sexta
feira pôr fim no caso tormentoso, com suas armas e laços.
Aquela sexta feira foi aguardada com grande anseio
e expectativa...não só pela população
rural, como a das cidades circunvizinhas, que ouviam e conheciam os fatos .
Durante
todos os dias que se seguiram, o assunto
não foi outro, em todos os lugares, pois a labuta diária não parava, tanto na
lavoura, como no comércio, ruas, lares,
bares, hortas e roças.
Só
que em noite de sexta feira, após as onze horas da noite, ninguém mais queria
sair fora de casa...por dinheiro nenhum...
Razão
pela qual, o homem, nortista valente, usando armas e cinturões recheados de
balas, a exemplo do temido Cangaceiro
Lampião, que viera, há pouco de fora, contratado, para pôr termo às aparições fantásticas,
passou a semana sendo admirado e invejado por todos daquela redondeza.
Até
que chegou o dia, digo, a noite tão esperada de sexta feira !
Assim
como Caculé, o nortista valente iria
sair à cata do homem que montava a porca, o pessoal resolveu também pôr a
cabeça de fora, e esperar pelo importante momento, depois das onze horas da
noite.
Algumas janelas se
abriam meio acanhadas e medrosas, poucas
portas se viam entreabertas, e os minutos passavam...
Lá
fora somente o Caculé, armado até os dentes, e um ventinho gelado e vagabundo
vagava por entre a rua...
Em
certo momento, após o relógio marcar meia noite, se ouviu um grande barulho, cães, gatos e outros animais da
fazenda corriam de um lado para outro, latindo, uivando, miando , relinchando, mugindo...
Olhava-se,
e, somente firme lá fora estava Caculé, olhando de um lado para outro... até
que, então surgiu a figura estranha montada na enorme porca, sendo que ambos
tinham os olhos vermelhos como fogo, e via-se que era o Capeta Chifrudo quem montava a porca, passando em grande velocidade, soltando
estridentes gritos, que atemorizavam à
todos que ouviam...foi um tal de gritar
, fechar portas e janelas rapidamente, em conjunto, que o barulho
tornou-se maior ainda...
Aqui
entre nós, naquele instante ,
todos procuravam pelo valente Caculé, pois não sei se foi a tétrica cena do
Capeta e sua porca, ou se foi o barulho do pessoal medroso
da fazenda, que assustou o
Caculé, fazendo com que ele saísse em
maior velocidade que o Capeta, deixando-o
para trás, e se embrenhasse cafezal adentro, vindo, em menos de uma
hora, parar, em Getulina, ofegante e cheio de pavor, com os trajes em farrapos
e muitas escoriações pelo corpo, onde, após lavar-se, fazer curativos, e trocar de roupas, contou para todos o presente caso, que se
espalhou por ai...
Milton Hauy
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