Faz muito tempo, e a nossa turma resolveu fazer, de uma noite linda, romântica , estrelada, uma noite macabra , horrenda, terrível...
E falava-se até em premiar a fantasia mais bonita, a melhor, a mais original, ou seja, a mais horrível, que metesse medo em todos...
Marcou-se, para a então próxima sexta-feira, 13, de um mês qualquer ( isso, é para não invocar algum aniversariante do então mês, criando problemas...).
O lugar escolhido, foi o cemitério, por volta da meia noite (vejam só, tanto lugar para se brincar, e a nossa juventude preferia , involuntariamente, profanar o campo santo , local que, sempre, mais progrediu, e progride, em nossa terra).
Pularíamos o muro, ou entraríamos pela valeta, e nas proximidades do cruzeiro nos concentraríamos , para o grande e esperado encontro...
O regulamento previa que, também, se poderia levar pequenas lanternas, lampiões, fósforos e velas.
Assim foi feito.
Mas, não foi grande o número de concorrentes, que se esperava, pois houve muitas desistências de última hora, da então programada participação, alegando as mais esfarrapadas desculpas, a fim de encobrirem o medaço dos cagões...
Apesar disso, teve até uma inscrição, feita por telefone, de uma jovem de Lins, Guaimbê, Cafelândia ou Promissão.
Os pré aquecimentos para o tétrico desfile, foram feitos nos mais diversos bares de nossa cidade, pela grande maioria, que tratou de ingerir cervejas, chopps, pingas, vodkas, wiskis, champagnes, conhaques e vinhos.
A noite parecia ter sido desenhada para o grande evento das muitas travessuras e poucas gostosuras...
No entanto, não era de lua cheia, e sim, quarto minguante, estrelada, escura, nevoenta, apesar de fresca, cuja brisa fazia ventar ora de leve, outras vezes, fortemente, um vento vagabundo que, assobiando, levava consigo folhas secas, papéis e plásticos , que esvoaçavam como pipas pelos ares... inclusive, também, sacudindo os galhos e folhas das árvores...
Via-se o desfilar de vultos estranhos, que se misturavam no ritual macabro ... enquanto no ar vagavam os vagalumes e pirilampos, o pessoal carregava velas acesas , cujas luzes temporárias , assustavam as corujas, outras aves notívagas, e os morcegos, estes em seus vôos rasantes, quase tocando as nossas cabeças , fazendo com que o maior dos machões , ou a mais corajosa das mulheres, sentisse arrepios de cima em baixo, ocasionando o bambear das pernas, em rápidas e ocultas tremedeiras....
Os que iam chegando, iam colocando as suas velas ao lado do Cruzeiro, e de lá enviavam luzes , que misturadas à luminosidade dos faróis dos veículos que passavam lá fora, e, momentaneamente , iluminavam lá dentro, nos mostrando o desfile macabro das pessoas com máscaras e fantasias, de vampiros, caveiras, lobisomens, fantasmas, sacís, bruxas, zumbís e duendes.
Paralelamente, a tudo isso, acontecia também, no mesmo local , um desfile mais rápido de lagartos, largatixas , ratos, calangos, baratas, formigas e aranhas, sob o som musical dos grilos , e o tristonho coaxar das rãs e dos sapos...
Ouvia-se adiante, os miados soturnos dos gatos pretos, e, depois, o uivar dos cães , parecendo lobos, completando o característico cenário dos filmes de terror...
Ao nosso lado, caminhava alguém com uma notória , fantástica e chocante fantasia , composta de uma máscara horrenda, era de bruxa, e , desde logo, já se imaginava ser ela a forte concorrente ao prêmio daquela importante noitada... não havia nada mais feio, simplesmente, horripilante !
Continuava a lenta caminhada, cada um observando o outro, cada passo, cada gesto, quase não se falava, apenas de quando em vez, um cochicho, um murmúrio , e vagas e pequenas risadas...
Olhava-se, desde a cabeça até os pés... do chapéu ou capuz, da máscara, até as botas ou botinas... as vestes reluzentes, as capas e mantos esvoaçantes, as luvas, tanto as de borrachas, plásticas ou de cetins, eram de um modo, quase que geral, pretas, mas, haviam também as brancas que contrastavam com a maioria das vestes negras....
Espalhadas pelo vasto cemitério, haviam sido colocadas as enormes caveiras, feitas de abóboras, mamões , e até de melancias ôcas, em cujo interior, foram colocadas velas acesas, que destacavam os furos, simbolizando os olhos, as bocas e narizes, fazendo do ambiente lúgubre, mais funéreo ainda, próprio para aquela ocasião .
Muitos traziam caixas de isopor, contendo gelo, ou garrafas de água gelada, que era para que se enfiasse as mãos ou as luvas, para depois tocarem as pessoas circunstantes, mostrando o gélido sentido da morte, ou dos mortos.
Era mesmo de arrepiar todos os cabelos !. Tanto os da cabeça, como os dos “cutuvelos”...
Ao longe, ouvíamos o ressoar do sino da matriz, enviando aos ares, as doze badaladas, que anunciavam ser meia noite, horário triunfal do início do desfile de horrores....
Quando passávamos pelas avenidas e quadras da necrópole, olhando de um lado para outro, às vezes até para trás, líamos nas lápides os diversos nomes dos ocupantes das variadas sepulturas, jazigos, túmulos e covas, de cada pessoa conhecida, familiar, amiga, ou desconhecida, que haviam há muito tempo, ou até recentemente, partido para o outro lado da vida , e de cada uma , nos vinha uma série de vagas e profundas, alegres e tristes, recordações ...
No desfile , cada pessoa ou participante, empunhava, senão um cajado, uma vara, algumas enormes, outras pequenas vassouras, espadas, lanças, foices, facões , punhais, chicotes, laços, bengalas,etc...
Até que então, chegou o momento tão esperado da proclamação da fantasia vencedora, cuja personagem, deveria se revelar, tirando a máscara, para receber os aplausos e o prêmio ... já se adentrava a noite , avizinhando-se a madrugada...
Ganhara a fantasia cintilante da Bruxa, que ostentava uma máscara horrenda , empunhando em uma das mãos uma foice, noutra enorme vassoura, a mulher que viera de fora, talvez, de Lins, Guaimbê, Cafelândia ou Promissão ...e fizera a sua inscrição, no concurso, pelo telefone, vencera a competição...
Naquele instante , os demais participantes passaram a retirar as suas máscaras , e solicitavam à vencedora que fizesse o mesmo, a fim de se revelar, dando o seu nome, mostrando o seu rosto, e ressaltando seu endereço, para conhecimento de todos...
A Bruxa vencedora, se negava em retirar sua máscara, mas insistia em levar o seu prêmio...
Aqui entre nós, após variados falatórios e discussões, a Campeã da noite , pediu a palavra, e disse em alto brado e bom som : - Eu não estou mascarada... eu sou assim mesma...
Em seguida, soltando estridente e sarcástica gargalhada subiu sobre sua vassoura e alçou vôo, passando sobre os jazigos, túmulos , covas, e todos nós , voou longe, perdendo-se na escuridão...
Todos ficaram pasmos e assustados, desde os mais machões até os mais medrosos dos participantes, que tremendo como varas verdes, olharam para todos os lados...e saíram em debandada carreira, largando tudo para trás, e levando tudo no peito, pulando o alto muro do cemitério, rumando cada um para sua casa, a fim de livrar-se , o quanto antes da fedentina, originária das fezes que escorriam pelas pernas abaixo , e, procurando, para limparem-se, tomar aquele banho, regado às mais variadas e perfumadas essências...
Milton Hauy
Todos já viveram, ou ouviram contar, uma série de casos e causos, sobrenaturais,que assustava a nossa infância, e hoje nos faz meditar, das coisas estranhas, desse nosso mundo estranho...
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